Dinheiro
do Santo
Nosso
sertão tem histórias
Que
até o diabo duvida
De
desventuras, de glórias,
De
coisas da outra vida.
Essa
que eu vou contar
Aconteceu
num lugar
Pequenino,pobre
e feio
Porém
de gente decente
De
cabra honesto e valente
Era
Riacho do Meio.
Naquele
tempo o distrito
Tinha
uma igreja pequena
Para
se cantar bendito
No
mês que tinha novena
O
povo todo acorria
Quando
a igreja abria
E
alguém o terço puxava
Outro
levava um dinheiro
Para
o santo milagreiro
E
aos seus pés depositava.
Um
frade tinha doado
À
capela do distrito
Um
santo muito afamado
Por
nome São Benedito
O
santo era poderoso
E
logo ficou famoso
Porque
mostrou muita raça
Quem
rezava e lhe pedia
Nem
bem da igreja saia
Já
tinha alcançado a graça.
Todo
tipo de promessa
O
povo vinha fazer
O
santo mais que depressa
Não
tardava em atender
Pedido
de todo jeito
Pra
se livrar de defeito,
Pro
ano ser bom de inverno
Moça
velha se casar
Ladrão
deixar de roubar
E
se livrar do inferno.
O
santo logo ganhou
O
titulo de padroeiro
O
padre a missa rezou
Para
o santo milagreiro
E
o povo na capela
Rezava,
acendia vela
Depois
cantava um bendito
Para
o santo padroeiro
E
não faltava dinheiro
Nos
pés de São Benedito.
No
ano quarenta e três
Teve
uma seca infeliz
Choveu
um quarto de mês
Dos
sertões aos cariris
E
Antonio Cabugé
Que
inda hoje vivo é.
Sem
ver mais nuvens no céu
E
a lavoura perdida
Resolveu
fazer partida
De
Barra de São Miguel.
E
foi procurar trabalho
Logo
em Riacho do Meio
Arrumou
um quebra-galho
Para
fazer um esteio
E
foi por ali ficando
Sempre,sempre
trabalhando
Todo
serviço enfrentava
Lutava
a semana inteira
Quando
era dia de feira
Umas
cachaças tomava.
Antonio
era um rapaz
Que
lhes dizer eu preciso
Não
era doido demais,
Nem
tinha muito juízo
Mais
era trabalhador
Honesto
e respeitador
Todos
lhe queriam bem
Era
bem visto na rua
Tomava
a cachaça sua
Sem
fazer mal a ninguém.
Quem
parte do cariri;
Um
lugar que chove pouco
E
vem parar por aqui
Só
pode ser mesmo louco.
Pois
se lá è ruim que dobra
Aqui
é pior e sobra
Padece
da mesma falha
Pra
quem vem de São Miguel
É
sair do fogaréu,
Pra
entrar numa fornalha.
Antonio
è feito dum talho
Que
hoje não se usa mais
Não
tem medo de trabalho
Mandou,
pagou, ele faz
Sua
palavra é um tiro
Até
o ultimo suspiro
Sustenta
a palavra dada
Mesmo
ninguém nunca viu
De
norte a sul do Brasil
Antonio
com enrolada.
Antonio
um dia tomou
Umas
bicadas a mais
Porque
ele misturou
Cana
com vinho São Brás
Não
era de embriagar-se
Mas
sem que ele notasse
Perdeu
o rumo dos astros
E
fico na ocasião
Como
se diz no sertão:
Fazendo
dum pé, dois rastros.
Antonio
então resolveu
Que
queria outra bicada
Porem
logo percebeu
Que
no bolso, tinha nada
Ficou
meio encabulado
Porque
já tinha alisado
E
não tinha uma ruela
Saiu
andando sem norte
E
por azar ou por sorte
Se
viu dentro da capela.
Quando
Antonio olhou de lado
Viu
a imagem do santo
E
ficou admirado
Quando
também viu o tanto
De
dinheiro velho e novo
Que
era oferta do povo
Para
o santo poderoso
Nisso
Antonio levantou-se
Da
imagem aproximou-se
E
disse em tom respeitoso:
Boa
tarde cidadão
Sô
Antôio Cabugè
Moro
perto do grotão
Trabaio
pra João Coité
Recebo
toda sumana
Quero
tumar uma cana
Mas
tô mei disprivinido
Percibi
sua bondade
E
tomei a liberdade
Di
li fazer um pidido:
Da
pru sinhô me arrumar
Do
muito cobre que tem
Cinco
minrés preu tumar
Uma
ali no armazém?
Podi
imprestar sem sobrosso
Que
sabu despois do armoço
Assim
que eu receber
O
meu pequeno ordenado
Podi
ficar sossegado
Que
eu vem aqui lhe trazer.
Comigo
não tem perigo
Do
sinhô num receber
Pode
escrever o que eu digo
Depois
espere pra ver
Se
eu tenho palavra ou não
Pois
daqui pru Riachão
Meu
nome é limpo na praça
E
se o sinhô mim emprestar
Garanto
de li pagar
Di
sabu que vem num passa.
São
Benedito ficou
Calado
e indiferente
Ele
consigo pensou:
Quem
cala é por que consente.
Ficou
na ponta dos pés
Pegou
os cinco minrés
Despediu-se
gentilmente
Com
o dinheiro emprestado
Entro
no bar de Conrado
Tomou
mais uma aguardente.
Tinha
um guarda na capela
Rezando
na sacristia
Escutou
toda novela
Que
Antonio ao santo dizia
E
resolveu esperar
Se
ele vinha pagar
Como
tinha prometido
E
depois achou por bem
Não
contar nada a ninguém
Sobre
o que tinha ocorrido.
Antonio
voltou pra roça
Trabalhou
feito um jumento
Sempre
a noite na palhoça
Lembrava
do juramento
E
consigo ia pensando:
Eita,
tá quage chegando
O
dia do ordenado
Compru
um sandaio prus pés
E
levo os cinco minrés
Daquele
homi educado.
Quando
enfim chegou o dia
Que
Antonio tinha marcado
Pegou
a justa quantia
E
partiu meio apressado
Quando
foi na rua entrando
De
longe foi avistando
Meio
sem acreditar
Pois
sim! era Cazuzinha
Seu
irmão menor que vinha
Da
Barra lhe visitar.
Se
entreteram meia hora
Num
constante blablablà
Antonio
lhe disse: Agora
Fique
aqui que eu volto já
Vou
acertar um negoço
Pois
me esquecer eu não posso
E
hoje é o dia certo
Depois
da conta acertada
Nós
toma uma bicada
Ali
no bar de Adaberto.
Quando
ele ia saindo
O
guarda se aproximou
Onde
o senhor está indo?
Zangado
lhe perguntou.
Deixe
dessa veiaquisse
Não
foi o senhor que disse
Que
hoje pagava o santo
Pois
pegue os cinco minrés
E
vá botar nos seus pés
Você
sabe onde è o canto.
Quando
Antonio aquilo ouviu
Ficou
dispranaviado
Pra
igreja se dirigiu
Sem
responder ao soldado
A
porta tava encostada
Deu
lhe logo uma pesada
Foi
tabua pra todo lado
Sem
que ninguém lhe impedisse
Pegou
o dinheiro e disse:
Toma
ai cabra safado.
Por
certo você pensava
Que
eu não vinha lhe pagar
Me
diga se precisava
Você
o guarda mandar
Cobrar
essa minxaria
Saiba
que essa quantia
Para
mim não vale nada
Comigo
você foi raso
Eu
inda tava no prazo
Você
que fez paiaçada.
Ao
ouvir o lambassé
O
sacristão perguntou
O
que è isso Cabugé,
Por
que a porta quebrou?
Antonio
lhe disse: nada!
Eu
e esse camarada
Tamu
acertando uns pendido
Fique
fora da manobra
Se
não o cacete sobra
Também
pru seu pé do uvido.
E
partiu feito um leão
Pra
cima de Benedito
Lhe
agarrou o sacristão
Uma
velha deu um grito
Juntou
gente pra danado
O
cacete foi pesado
Não
ficou um banco em pé
Por
mais gente que juntasse
Não
tinha quem sigurasse
A
fùria de Cabugé.
Quem
chegava pra apartar
Um
bufete recebia
Com
raiva, pra se vingar
Com
pancada respondia
E
a briga ia aumentando
E
sempre gente chegando
Homem,
mulher e menino
Quebraram
com uma vassoura
A
caixa da difusoura
E
toraram a corda do sino.
No
meio da confusão
Quebraram
a chapa de Noca
Acertaram
um bufetão
Na
filha de Zé de Doca
Depois
rasgaram o vestido
De
Zefa de zé cumprido
Inda
hoje ela tem mágoa
Ligeira
como um foguete
Pra
se livrar do cacete
Saiu
correndo de anágua.
E
nisso banco voava
E
na parede batia
Um
deles quase acertava
Nossa
Senhora da Guia
No
meio da bagaceira
Um
pedaço de cadeira
Acharam
por bem jogá-lo
Mesmo
em São Jorge, patrão
Que
ficou só o dragão
E
um taco do cavalo.
Quebrou-se
o confessionário
De
um coice que Antonio deu
O
pobre São Januário
De
um golpe que recebeu
Começou
a balançar
Não
tendo onde se apoiar
Espatifou-se
no chão
Jogaram
um pau em Abreu
Trincou
São Judas Tadeu
Quebrou
São Sebastião.
Tinha
uma imagem indefesa
De
São José e Jesus
Jogaram
um taco de mesa
Acertou
logo na luz
Depois
atingiu o santo
Foi
caco pra todo canto
O
fuzuê foi bonito
A
santaiada quebrada
Só
quem não levou pancada
Foi
mesmo São Benedito.
A
bagunça se desfez
Quando
a policia chegou
Todo
mundo pro xadrez!
O
delegado frisou.
Algemaram
todo mundo
Somente
José Raimundo
Filho
de Nhô Nicolau
Invés
de ir pra cadeia
Passou
foi semana e meia
Na
cama do Hospital.
Liberaram
cabugé
Depois
de alguns contatos
Porque
nenhum um doido é
Responsável
por seus atos
Liberaram
todo mundo
Depois
também Zé Raimundo
Teve
alta do hospital
Riacho
do Meio aos poucos
Apesar
dos muitos loucos
Ia
voltando ao normal.
Indireitaram
a capela
Madaram
imendar os santos
Bendito
louvado seja!
Dizia
o povo entre prantos
Sempre
entoando bendito
Louvando
São Benedito
Que
do furdunço escapou
Já
tem outra imagem até
De
Jesus e São José
No
lugar da que quebrou.
O
vigário novamente
Fez
a inauguração
E
disse:daqui pra frente
É
pra prestar atenção
Quando
quiserem brigar
Procurem
outro lugar
Pra
fazer esse serviço.
Vão
bagunçar noutros cantos
Que
aqui sobrou foi pros santos
Que
não têm nada com isso.
Antonio
voltou pra lida
Tocou
a vida pra frente
Manerou
com a bebida
Mas
inda toma aguardente
Continua
sem preguiça
Vez
enquando vai à missa
Reza
pra Santo Expedito,
São
José do Ribamar
Mas,
não quer nem escutar
O
nome São Benedito.
Brás
Ivan
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