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segunda-feira, 7 de janeiro de 2013





Giuseppe Artidoro Ghiaroni (Paraíba do Sul, 22 de fevereiro de 1919 — Rio de Janeiro, 21 de fevereiro de 2008) foi um jornalista e poeta brasileiro.

De origem humilde, em sua juventude Ghiaroni foi aprendiz de ferreiro, ajudante de cozinha e office-boy. Ao mudar-se para a cidade do Rio de Janeiro, trabalhou como redator do "Suplemento Literário" e no jornal "A Noite", de onde passou para a Rádio Nacional (ambas as empresas ficavam no mesmo edifício, na Praça Mauá, centro do Rio) onde consagrou-se como cronista daquela emissora. Foi o autor de "Mãe", uma das novelas de maior sucesso da Rádio Nacional e que em 1948 foi transformada em filme (Mãe) com a direção de Teófilo de Barros Filho.

Ghiaroni foi ainda contratado da Rede Globo. Entre outros trabalhos, assessorou Chico Anysio na década de 1990, quando este produzia a "Escolinha do Professor Raimundo".

Dia das Mães

Mãe! eu volto a te ver na antiga sala
onde uma noite te deixei sem fala
dizendo adeus como quem vai morrer.
E me viste sumir pela neblina,
porque a sina das mães é esta sina:
amar, cuidar, criar, depois... perder.

Perder o filho é como achar a morte.
Perder o filho quando, grande e forte,
já podia ampará-la e compensá-la.
Mas nesse instante uma mulher bonita,
sorrindo, o rouba, e a avelha mãe aflita
ainda se volta para abençoá-la

Assim parti, e nos abençoaste.
Fui esquecer o bem que me ensinaste,
fui para o mundo me deseducar.
E tu ficaste num silêncio frio,
olhando o leito que eu deixei vazio, 
cantando uma cantiga de ninar.

Hoje volto coberto de poeira
e te encontro quietinha na cadeira,
a cabeça pendida sobre o peito.
Quero beijar-te a fronte, e não me atrevo.
Quero acordar-te, mas não sei se devo,
não sinto que me caiba este direito.

O direito de dar-te este desgosto,
de te mostrar nas rugas do meu rosto
toda a miséria que me aconteceu.
E quando vires e expressão horrível
da minha máscara irreconhecível,
minha voz rouca murmurar:''Sou eu!"

Eu bebi na taberna dos cretinos,
eu brandi o punhal dos assassinos,
eu andei pelo braço dos canalhas.
Eu fui jogral em todas as comédias,
eu fui vilão em todas as tragédias,
eu fui covarde em todas as batalhas.

Eu te esqueci: as mães são esquecidas.
Vivi a vida, vivi muitas vidas,
e só agora, quando chego ao fim,
traído pela última esperança,
e só agora quando a dor me alcança
lembro quem nunca se esqueceu de mim.

Não! Eu devo voltar, ser esquecido.
Mas que foi? De repente ouço um ruído;
a cadeira rangeu; é tarde agora!
Minha mãe se levanta abrindo os braços
e, me envolvendo num milhão de abraços,
rendendo graças, diz:"Meu filho!", e chora.

E chora e treme como fala e ri,
e parece que Deus entrou aqui,
em vez de o último dos condenados.
E o seu pranto rolando em minha face
quase é como se o Céu me perdoasse,
me limpasse de todos os pecados.

Mãe! Nos teus braços eu me transfiguro.
Lembro que fui criança, que fui puro.
Sim, tenho mãe! E esta ventura é tanta
que eu compreendo o que significa:
o filho é pobre, mas a mãe é rica!
O filho é homem, mas a mãe é santa!

Santa que eu fiz envelhecer sofrendo,
mas que me beija como agradecendo
toda a dor que por mim lhe foi causada.
Dos mundos onde andei nada te trouxe,
mas tu me olhas num olhar tão doce
que , nada tendo, não te falta nada.

Dia das Mães! É o dia da bondade
maior que todo o mal da humanidade
purificada num amor fecundo.
Por mais que o homem seja um mesquinho,
enquanto a Mãe cantar junto a um bercinho
cantará a esperança para o mundo!

A estudante, a casada e a perdida

Num tempo que vai longe em minha vida
E que eu lembro muito bem mesmo distante
Três amores eu tive: uma estudante
Uma mulher casada e uma perdida

A estudante eu amava afoitamente
Antes da escola mal o sol nascido
A casada na ausência do marido
E a perdida depois do expediente

Era no tempo das imagens belas
Escrevi um poema certa vez
Um poema inspirado em uma delas
Mas fiz três cópias para dar as três

E as três choraram de emoção profusa
Cada qual se sentindo retratada
Cada qual chorou lágrimas de musa
A estudante, a perdida e a casada

Assim algo encontrei de semelhante
Nos diversos amores desta vida
Que a casada tem algo da estudante
E que as duas têm muito da perdida.

DIA DOS PAIS


Meu pai está tão velhinho,
tem a mão branca e comprida,
parecendo a sua vida,
longa vida que se esvai.
E eu o lembro quando moço
de uma atlética altivez.
Ah! Tinha força por três!
Você se lembra, papai?

Menino, ouvia dizer
que você era um gigante.
Eu ficava radiante
e também me agigantava.
Porque toda madrugada,
eu quentinho do agasalho,
ao sair para o trabalho
o gigante me beijava.

Sua grande mão de ferro
parecia leve, leve
naquela carícia breve
que da memória não sai.
Depois… um beijo em mamãe
e o meu gigante partia.
E a casa toda tremia
com os passos de papai.

Mas agora o seu retrato
muito moço, muito antigo,
se parece mais comigo
do que mesmo com você.
Você já lembra vovô
e, à medida que envelhece,
papai, você se parece
com mamãe, não sei por quê.

Você se lembra, papai?
Quando mamãe, de repente,
caiu de cama, doente,
era o pai quem cozinhava.
Tão grande e desajeitado
a varrer… Quando eu o via
de avental, papai, eu ria;
eu ria e mamãe chorava.

Eu quis deixar o ginásio
para ganhar ordenado,
ajudar meu pai cansado,
mas tal não aconteceu.
Papai disse estas palavras:
Sou um operário obscuro,
mas você terá futuro,
será melhor do que eu.

Eu? Melhor que este velhinho
a quem devo o pão e o estudo?
Que é pobre porque deu tudo
à Família, à Pátria, à Fé?
Meu pai, com todo o diploma,
com toda a universidade,
quisera eu ser a metade
daquilo que você é.

E quero que você saiba
que, entre amigos, conversando,
meu assunto vai girando
e no seu nome recai.
Da sua força, coragem,
bondade eu conto uma história.
Todos vêem que a minha glória
é ser filho de meu pai.

“Um dia eu fui tomar banho
no rio que estava cheio.
Quando a correnteza veio,
vi a morte aparecer.
Papai saltou dentro d’água
nadando mais que um peixe,
salvou-me e disse:_ Não deixe!
Não deixe mamãe saber!”.

Assim foi meu pai, o forte
que respeitava a fraqueza.
Nunca humilhou a pobreza,
nunca a riqueza o humilhou.
Estava bem com os homens
e com Deus estava bem.
Nunca fez mal a ninguém
e o que sofreu perdoou.

Perdoa então se lhe falo
Daquilo que não se esquece.
E a minha voz estremece
e há uma lágrima que cai.
Hoje sou eu o gigante
e você é pequenino.
Hoje sou eu que me inclino.
Papai… a bênção, papai.


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