Giuseppe Artidoro Ghiaroni (Paraíba do Sul,
22 de fevereiro de 1919 — Rio de Janeiro, 21 de fevereiro de 2008) foi um
jornalista e poeta brasileiro.
De origem humilde, em sua juventude Ghiaroni
foi aprendiz de ferreiro, ajudante de cozinha e office-boy. Ao mudar-se para a
cidade do Rio de Janeiro, trabalhou como redator do "Suplemento
Literário" e no jornal "A Noite", de onde passou para a Rádio
Nacional (ambas as empresas ficavam no mesmo edifício, na Praça Mauá, centro do
Rio) onde consagrou-se como cronista daquela emissora. Foi o autor de
"Mãe", uma das novelas de maior sucesso da Rádio Nacional e que em
1948 foi transformada em filme (Mãe) com a direção de Teófilo de Barros Filho.
Ghiaroni foi ainda contratado da Rede Globo.
Entre outros trabalhos, assessorou Chico Anysio na década de 1990, quando este
produzia a "Escolinha do Professor Raimundo".
Dia das Mães
Mãe!
eu volto a te ver na antiga sala
onde
uma noite te deixei sem fala
dizendo
adeus como quem vai morrer.
E
me viste sumir pela neblina,
porque
a sina das mães é esta sina:
amar,
cuidar, criar, depois... perder.
Perder
o filho é como achar a morte.
Perder
o filho quando, grande e forte,
já
podia ampará-la e compensá-la.
Mas
nesse instante uma mulher bonita,
sorrindo,
o rouba, e a avelha mãe aflita
ainda
se volta para abençoá-la
Assim
parti, e nos abençoaste.
Fui
esquecer o bem que me ensinaste,
fui
para o mundo me deseducar.
E
tu ficaste num silêncio frio,
olhando
o leito que eu deixei vazio,
cantando
uma cantiga de ninar.
Hoje
volto coberto de poeira
e
te encontro quietinha na cadeira,
a
cabeça pendida sobre o peito.
Quero
beijar-te a fronte, e não me atrevo.
Quero
acordar-te, mas não sei se devo,
não
sinto que me caiba este direito.
O
direito de dar-te este desgosto,
de
te mostrar nas rugas do meu rosto
toda
a miséria que me aconteceu.
E
quando vires e expressão horrível
da
minha máscara irreconhecível,
minha
voz rouca murmurar:''Sou eu!"
Eu
bebi na taberna dos cretinos,
eu
brandi o punhal dos assassinos,
eu
andei pelo braço dos canalhas.
Eu
fui jogral em todas as comédias,
eu
fui vilão em todas as tragédias,
eu
fui covarde em todas as batalhas.
Eu
te esqueci: as mães são esquecidas.
Vivi
a vida, vivi muitas vidas,
e
só agora, quando chego ao fim,
traído
pela última esperança,
e
só agora quando a dor me alcança
lembro
quem nunca se esqueceu de mim.
Não!
Eu devo voltar, ser esquecido.
Mas
que foi? De repente ouço um ruído;
a
cadeira rangeu; é tarde agora!
Minha
mãe se levanta abrindo os braços
e,
me envolvendo num milhão de abraços,
rendendo
graças, diz:"Meu filho!", e chora.
E
chora e treme como fala e ri,
e
parece que Deus entrou aqui,
em
vez de o último dos condenados.
E
o seu pranto rolando em minha face
quase
é como se o Céu me perdoasse,
me
limpasse de todos os pecados.
Mãe!
Nos teus braços eu me transfiguro.
Lembro
que fui criança, que fui puro.
Sim,
tenho mãe! E esta ventura é tanta
que
eu compreendo o que significa:
o
filho é pobre, mas a mãe é rica!
O
filho é homem, mas a mãe é santa!
Santa
que eu fiz envelhecer sofrendo,
mas
que me beija como agradecendo
toda
a dor que por mim lhe foi causada.
Dos
mundos onde andei nada te trouxe,
mas
tu me olhas num olhar tão doce
que
, nada tendo, não te falta nada.
Dia
das Mães! É o dia da bondade
maior
que todo o mal da humanidade
purificada
num amor fecundo.
Por
mais que o homem seja um mesquinho,
enquanto
a Mãe cantar junto a um bercinho
cantará
a esperança para o mundo!
A estudante, a casada
e a perdida
Num
tempo que vai longe em minha vida
E
que eu lembro muito bem mesmo distante
Três
amores eu tive: uma estudante
Uma
mulher casada e uma perdida
A
estudante eu amava afoitamente
Antes
da escola mal o sol nascido
A
casada na ausência do marido
E
a perdida depois do expediente
Era
no tempo das imagens belas
Escrevi
um poema certa vez
Um
poema inspirado em uma delas
Mas
fiz três cópias para dar as três
E
as três choraram de emoção profusa
Cada
qual se sentindo retratada
Cada
qual chorou lágrimas de musa
A
estudante, a perdida e a casada
Assim
algo encontrei de semelhante
Nos
diversos amores desta vida
Que
a casada tem algo da estudante
E
que as duas têm muito da perdida.
DIA DOS PAIS
Meu
pai está tão velhinho,
tem
a mão branca e comprida,
parecendo
a sua vida,
longa
vida que se esvai.
E
eu o lembro quando moço
de
uma atlética altivez.
Ah!
Tinha força por três!
Você
se lembra, papai?
Menino,
ouvia dizer
que
você era um gigante.
Eu
ficava radiante
e
também me agigantava.
Porque
toda madrugada,
eu
quentinho do agasalho,
ao
sair para o trabalho
o
gigante me beijava.
Sua
grande mão de ferro
parecia
leve, leve
naquela
carícia breve
que
da memória não sai.
Depois…
um beijo em mamãe
e
o meu gigante partia.
E
a casa toda tremia
com
os passos de papai.
Mas
agora o seu retrato
muito
moço, muito antigo,
se
parece mais comigo
do
que mesmo com você.
Você
já lembra vovô
e,
à medida que envelhece,
papai,
você se parece
com
mamãe, não sei por quê.
Você
se lembra, papai?
Quando
mamãe, de repente,
caiu
de cama, doente,
era
o pai quem cozinhava.
Tão
grande e desajeitado
a
varrer… Quando eu o via
de
avental, papai, eu ria;
eu
ria e mamãe chorava.
Eu
quis deixar o ginásio
para
ganhar ordenado,
ajudar
meu pai cansado,
mas
tal não aconteceu.
Papai
disse estas palavras:
Sou
um operário obscuro,
mas
você terá futuro,
será
melhor do que eu.
Eu?
Melhor que este velhinho
a
quem devo o pão e o estudo?
Que
é pobre porque deu tudo
à
Família, à Pátria, à Fé?
Meu
pai, com todo o diploma,
com
toda a universidade,
quisera
eu ser a metade
daquilo
que você é.
E
quero que você saiba
que,
entre amigos, conversando,
meu
assunto vai girando
e
no seu nome recai.
Da
sua força, coragem,
bondade
eu conto uma história.
Todos
vêem que a minha glória
é
ser filho de meu pai.
“Um
dia eu fui tomar banho
no
rio que estava cheio.
Quando
a correnteza veio,
vi
a morte aparecer.
Papai
saltou dentro d’água
nadando
mais que um peixe,
salvou-me
e disse:_ Não deixe!
Não
deixe mamãe saber!”.
Assim
foi meu pai, o forte
que
respeitava a fraqueza.
Nunca
humilhou a pobreza,
nunca
a riqueza o humilhou.
Estava
bem com os homens
e
com Deus estava bem.
Nunca
fez mal a ninguém
e
o que sofreu perdoou.
Perdoa
então se lhe falo
Daquilo
que não se esquece.
E
a minha voz estremece
e
há uma lágrima que cai.
Hoje
sou eu o gigante
e
você é pequenino.
Hoje
sou eu que me inclino.
Papai…
a bênção, papai.
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